Um estudo publicado nesta semana na revista científica Communicatios Biology confirmou que os incêndios de 2020 no Pantanal impactaram em 45% da população estimada de onças-pintadas.
O artigo mostrou o resultado da análise de 12 pesquisadores que combinaram dados de satélite sobre a tragédia ambiental com informações sobre a população das onças da região e sobre os deslocamentos dos bichos pelo território.
O documento ainda trouxe um alerta para o bioma que possui a segunda maior concentração de onças-pintadas do mundo. Ao lado das mudanças climáticas e de uso da terra, os recentes mega-incêndios no Pantanal podem representar uma ameaça à sobrevivência das onças a longo prazo.
“Os incêndios de 2020 foram os mais graves da série anual, queimaram 31% do Pantanal e afetaram 45% da população estimada de onças-pintadas (87% delas no Brasil); 79% das áreas de alcance residencial e 54% das áreas protegidas dentro das faixas domésticas. Os incêndios consumiram habitats centrais e feriram várias onças, predadora do ápice do Pantanal”, destaca do artigo.
Na época dos incêndios quatro onças-pintadas chegaram a ser resgatadas. Na região da Serra do Amolar, em Corumbá, um macho e uma fêmea receberam os primeiros cuidados do Gretap (Grupo de Resgate Técnico Animal Cerrado Pantanal). Uma não resistiu e a outra, denominada Jou-Jou conseguiu ser reinserida na natureza.
Na região de Poconé e Porto Jofre (MT) outras duas onças, batizadas de Amanci e Ousado foram resgatadas. O macho já foi reintroduzido. Já a fêmea teve dificuldade para o tratamento das patas queimadas, por conta dos tendões que lhe permitem expor as garras. Mas o indivíduo conseguiu ter um filhote batizado de Apoema. Sob tutela do Instituto Nex, os dois animais agora passam por treinamentos para garantir que vão conseguir sobreviver ao retornar ao Pantanal.
Esses animais, que são sobreviventes de gerações que foram vítimas da caça humana, enfrentam agora dificuldades para descolamento dentro do bioma que ainda se recupera dos incêndios, além de fome, desidratação e defesa territorial.
Com a redução de espécies, a taxa de fecundidade com cargas genéticas de diferentes indivíduos afeta diretamente na quantidade de animais. Outro fator importante a ser acrescentando é que a onça-pintada é animal de topo de cadeia. Com isso, outras espécies menos móveis são impactadas, refletindo na estabilidade ecológica da região.
“Uma solução para evitar a recorrência de mega-incêndios está no combate às causas antropogênicas que intensificam as condições de seca, como a implementação de ações de proteção de nascentes, o aumento do número e área de áreas protegidas, a regulação do uso de fogo e a alocação de brigadas de incêndio antes das estações secas”, sugeriu o estudo.
Dados
Para mensurar o impacto dos incêndios nos últimos 16 anos, os pesquisadores usaram dois tipos de dados. Primeiro as estimativas publicadas de abundância de onças para toda a sua faixa geográfica com base em previsões espaciais de densidade e distribuição. Segundo as áreas em que o animal gasta sua vida estimadas para 48 onças residentes monitoradas entre 2005 e 2016 no Pantanal.
“Adotamos uma abordagem semelhante à de um estudo que investiga os impactos do desmatamento e das queimadas em onças-pintadas na Amazônia. Usamos estimativas de densidade de onças em áreas sobrepostas à ocorrência de medidores de incêndio para o número de animais potencialmente deslocados, feridos ou mortos por incêndios”, explicou o documento.
Com isso, os incêndios atingiram 45% (746 indivíduos) da população estimada de onças-pintadas em todo o Pantanal (1668 indivíduos). “Esse número é 3,3 vezes a mediana de 15 anos anteriores, se usarmos os mesmos dados sobre densidades populacionais e dados meses sobre a área afetada por incêndios. O Pantanal brasileiro apresentou a maior proporção de onças afetadas por incêndios (87%, n = 649 indivíduos), seguido pelo boliviano (12%) e pelo Pantanal paraguaio (1%).”