Lei Maria da Penha completa 16 anos com um feminicídio a cada 10 dias em MS

Com registro de 27 feminicídios em 2022, Lei Maria da Penha já passou por alterações cruciais desde sua criação

A Lei Maria da Penha completa 16 anos neste domingo (7) e é um importante instrumento legal para o combate e defesa contra a violência doméstica, prevendo em seus artigos a tipificação de crimes, aplicação de pena e garantia de proteção e assistência social às vítimas. O nome refere-se à biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, que ficou paraplégica em 1983 após levar um tiro do marido enquanto dormia.

Em Mato Grosso do Sul, até a última quarta-feira (4), 27 mulheres morreram vítimas de feminicídio desde o início de 2022, o que representa uma morte a cada dez dias no estado.

De acordo com a Coordenadora de Projetos e Ações Temáticas da Subsecretaria de Políticas para a Mulher de Campo Grande, Márcia Paulino, a Lei Maria da Penha exerce importante papel para evidenciar as diferentes violências que a mulher pode estar submetida e que foram ao longo do tempo naturalizadas, como a sexual e psicológica.

“A Lei Maria da Penha provocou na sociedade uma maior compreensão do conceito de violência e no poder público uma ampliação da responsabilidade com o enfrentamento às desigualdades e violências que afetam as mulheres. Serviços especializados de atendimento foram criados ou ampliados, a exemplo da Casa da Mulher Brasileira de Campo Grande”, explica a coordenadora.

Depois da implantação da lei, conforme Márcia explica, outras legislações de proteção às mulheres foram criadas, à exemplo da Lei do Feminicídio, da Lei do Stalking e da Lei da Violência Psicológica, aumentando as possibilidades de proteção para atos antes naturalizados e aceitos culturalmente. 

Irmãs, filhas, mães, avós, sogras, cunhadas, são vítimas de violência doméstica cotidianamente e também podem buscar ajuda na rede de proteção. “É importante ressaltar que a Lei não é somente para relações íntimas de afeto entre homens e mulheres – namorados, ex-namorados, maridos, ex-maridos – mas para relações de afeto entre pessoas da família ou que tenham convivido, incluindo relações homoafetivas entre mulheres”, ela exemplifica.

O texto da Lei passou 11 anos sem alterações. A primeira veio em 2017 e, desde então, foi modificada nos anos seguintes como tentativa de aprimoramento, como explica a professora de ciências criminais em cursos de graduação e de pós-graduação em Direito, Marianny Alves.

Em 2017, foram incluídos artigos que garantiram uma série de direitos para a mulher em situação de violência doméstica ou familiar, como ser atendida preferencialmente por servidoras previamente capacitadas nesse tipo de atendimento.

Lei Maria da Penha

A professora pontua que além das modificações no texto, é preciso investimento para implantar o que é declarado na legislação, especialmente em cidades do interior, porque a maior parte das estruturas estão nas capitais. 

“Posso dizer que a melhoria nem seria na Lei em si, mas na estrutura dessa rede de enfrentamento à violência contra a mulher. Porque não basta que algo esteja previsto na Lei, é preciso que haja, de fato, investimento e planejamento que permita sua plena efetividade”, afirma Marianny.

No mesmo sentido, Márcia Paulino diz que é preciso aumentar a velocidade na tramitação das ações na justiça. “O Poder Judiciário precisa de uma estrutura que consiga dar conta, com celeridade, do acumulado de processos de violência doméstica que faz com que as vítimas precisem esperar por anos por uma resposta judicial, o que muitas vezes, descredibiliza a própria Lei e sua importância”, afirma a coordenadora.

A professora Marianny acredita também que é preciso reconhecer o machismo como um problema estrutural na sociedade e que o tema esteja presente nos cursos de capacitação dos servidores da justiça que atendem as vítimas de violência e nos programas de acompanhamento psicossocial de caráter preventivo dos agressores.

“Se os sujeitos envolvidos nesse processo continuam inseridos numa lógica heteronormativa que coloca a mulher como o outro nas relações sociais, é impossível que esse agressor compreenda que não detém o domínio sobre o corpo e sobre a subjetividade da mulher”, ela diz.

Medidas Protetivas

De acordo com dados do TJ MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), entre as 531 mulheres mortas ou vítimas de tentativa de feminicídio no estado entre 2016 e julho de 2022, 252 tinham medida protetiva contra o agressor.

Para a coordenadora Márcia Paulino, as medidas protetivas são um importante instrumento de proteção contra a violência. “Atualmente, existem cerca de nove mil mulheres com medidas protetivas vigentes em Campo Grande, o que evidencia que este é um fator de proteção e possibilita uma maior segurança das mulheres”, ela diz.

Para a professora Marianny, o recurso é um ponto de partida emergencial para o fim da inferiorização da vida da mulher, mas que precisa ser trabalhado com outras políticas públicas para garantir o rompimento definitivo do ciclo de violência.

Mato Grosso do Sul

A criação da Lei Maria da Penha desencadeou nos anos seguintes a criação de novas leis que tipificam crimes e a implantação de novas políticas públicas. Em 2015, Mato Grosso do Sul foi o primeiro estado a receber uma unidade da Casa da Mulher Brasileira, onde foi implementado um plantão 24 horas para a DEAM (Delegacia da Mulher).

Conforme relembra a professora de ciências criminais, Mato Grosso do Sul foi o segundo do Brasil a implementar a Delegacia de Atendimento à Mulher, em 1986 (o primeiro foi São Paulo, em 1985), e o primeiro a ter uma Defensoria Pública de Defesa da Mulher, em 1999.

“Acredito que a criação de todas essas instituições são os frutos das políticas de proteção previstas na própria Lei Maria da Penha, que não se trata de mero punitivismo, mas de verdadeira política pública”, explica Marianny.

Agosto Lilás

Em comemoração ao aniversário da Lei Maria da Penha, neste mês foi lançada a campanha “Agosto Lilás” para evidenciar o enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher. Em Mato Grosso do Sul, a campanha foi instituída pela Lei Estadual nº 4.969 de 2016.

O mesmo texto  também criou o programa “Maria da Penha Vai à Escola” e nos anos seguintes foram incorporados ações em diferentes localidades e contextos sociais, como: Maria da Penha vai à Igreja, Maria da Penha vai ao Campo, Maria da Penha vai à Empresa, Maria da Penha vai à Aldeia, Maria da Penha vai ao Quilombo, Maria da Penha vai ao Bairro, Maria da Penha vai à Feira.

Canais de Denúncia

Em caso de violência contra a mulher, é possível ligar imediatamente para a Polícia Militar no 190 ou ainda no canal de atendimento específico na Central de Atendimento à Mulher pelo telefone 180.

Todas as delegacias de Polícia Civil podem fazer o registro de boletim de ocorrência. A DEAM (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher) em Campo Grande está localizada na Rua Brasília, S/N, Jardim Imá. O telefone da delegacia é (67) 4042-1324 / Ramal 1311.

Mato Grosso do Sul possui no total 12 unidades da Deam no interior do estado: 

Aquidauana

Endereço: Francisco de Castro  nº 730 – Bairro: Guanandi – CEP: 79200-000

Telefone: (067) 3241-1172

E-mail: damaquidauana@pc.ms.gov.br

Bataguassu

Endereço: Rua Padre Anchieta, 530 – Bairro Jardim São Francisco 0 CEP: 79780-000

Telefone: (067) 3541-1013

E-mail: dam.bataguassu@pc.ms.gov.br

Corumbá

Endereço: Rua Major Gama, 290 – Centro – CEP 79330-000

Telefone: (067) 3234-9904 / 3234-9923

E-mail: dam@corumba.ms.gov.br