O médico obstetra Ricardo da Fonseca Chauvet, de 62 anos, foi condenado à perda do cargo no município de Corumbá, cinco anos depois de ser gravado cobrando R$ 1 mil para fazer cirurgia em paciente do SUS (Sistema Único de Saúde). Ele também terá de pagar multa civil e sofrerá uma série de restrições para contratar com o Poder Público.
A condenação confirma decisão da Prefeitura de Corumbá, que demitiu o médico há um ano ao término de PAD (Procedimento Administrativo Disciplinar). Por força de liminar, o médico já estava afastado do cargo desde 2019, quando foi feita a denúncia.
Chauvet só foi descoberto depois que paciente o gravou e foi à polícia. Kerolaine Campelo dos Santos, à época com 25 anos, precisava retirar pólipo uterino e se internou na Santa Casa de Corumbá. Ela relatou que enquanto estava sozinha no quarto, o médico teria perguntado se ela faria uma faxina na casa dele por R$ 24. “É isso que o Estado me paga pra operar você”, completou.
O médico, então, informou que não faria a retirada do pólipo apenas por esse valor, e informou o preço que cobraria para fazer o procedimento. Quando o marido da jovem chegou ao hospital, o casal voltou ao consultório e gravou o médico dizendo que faria um acerto “a parte”. “Em dinheiro, sem recibo e antecipado”, ele ainda avisa.
O profissional fala de valores: R$ 3 mil para fazer o procedimento em consultório, R$ 5 mil que o casal gastaria se fosse paciente particular da maternidade da Santa Casa ou R$ 1 mil para o médico “facilitar” a cirurgia pelo SUS. Chauvet mesmo explica: “Só que isso é ilegal, tá? Mas eu tenho duas opções: ou o ilegal ou eu não faço”.
Depois do caso, o MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) conseguiu descobrir outras cobranças. “Valendo-se de seu cargo público de médico do Município de Corumbá, bem como de sua função pública de médico ginecologista e obstetra da Maternidade da Santa Casa de Corumbá, por reiteradas vezes solicitou de pacientes que eram atendidos (gratuitamente) pelo Sistema Único de Saúde vantagem indevida, para si, para a prática de atos de ofício, chegando, inclusive, a obter quantia pecuniária dos expedientes ilícitos”.
Entre 2015 e 2019, foram um total de R$ 18,2 mil cobrados de seis pacientes, conforme a denúncia.
Outro lado
O médico se defendeu alegando que “jamais cobrou propina de pacientes” e que, na verdade, os valores serviam para “ajudar” nos tratamentos. “A título de exemplo, toma-se como base o caso da suposta ofendida Kerolaine Campelo dos Santos. Com efeito, o procedimento necessário para tratamento dessa paciente não estava integralmente coberto pelo SUS, de modo que havia necessidade de locação de equipamento específico. Toda a atuação do demandado em sua profissão visava sempre tentar ajudar seus pacientes a terem o melhor tratamento possível. Ele sempre esteve imbuído de boa fé e altruísmo. Não há que se falar em prejuízo ao erário, muito menos em enriquecimento ilícito, uma vez que não houve desvio de dinheiro púbico, nem cobrança de valores para benefício pessoal”, argumentou a defesa.
A decisão
A juíza Luiza Vieira Sá de Figueiredo, da Vara de Fazenda Pública e de Registros Públicos de Corumbá, entendeu, contudo, que só ficou comprovado em dois casos que o médico “efetivamente recebeu as quantias solicitadas”. Por isso, ele foi condenado a pagar multa civil de R$ 5 mil (valor total da ambas as cobranças) por enriquecimento ilícito.
Ela também decidiu condená-lo a perder o cargo conquistado em concurso em 1990. “Considerando a gravidade dos fatos, que cingem-se na solicitação de valores elevados de pacientes atendidos pela rede pública de saúde, muitos deles sem nenhuma condição financeira para arcar com os valores e diante da vulnerabilidade desses pacientes atendidos, notadamente pelo fato de necessitarem de atendimento médico público e serem coagidos a efetuar pagamento de valores para atendimento médico que deveria ser prestado de forma gratuita pelo médico do município, ora requerido, cabível a decretação da perda da função pública, que atingirá somente o vínculo com o Município de Corumbá, porquanto o ilícito fora praticado nesse cargo e em razão dele”.
A decisão, do dia 9 de agosto, é de primeiro grau e, portanto, ainda cabe recurso.
Edição: Campo Grande News
Fonte: https://www.diarionline.com.br/?s=noticia&id=146675