Para especialistas, Congresso deve se envolver nas ações de combate ao fogo no Pantanal

A vinda das ministras do Meio Ambiente, Marina Silva, e do Planejamento, Simone Tebet, ao Pantanal, além do envio de brigadas da Força Nacional e avião superpotente para lançar água, mostra articulação entre o Poder Executivo de Mato Grosso do Sul e federal para enfrentar os incêndios que devastam o Pantanal.

Na visão de cinco especialistas ouvidos pela Folha de São Paulo, isso é insuficiente e falta o envolvimento do Congresso nas ações.

Biólogo e diretor da organização SOS Pantanal, Gustavo Figueroa avalia a resposta ao fogo dada no primeiro semestre deste ano, e defende que a prevenção vire uma política estatal. 

“Está longe de ser perfeita. Esse ano a resposta foi mais rápida, apesar de ter acontecido quando o fogo já estava subindo. Houve melhor integração. Na questão preventiva, principalmente, pode melhorar muito. Precisa virar uma política pública independente de governante”, diz.

Queimaram 946 mil hectares no ano passado, enquanto o fogo tomou conta de mais de 700 mil hectares até o fim de junho, de acordo com dados do Lasa (Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais) da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). O que foi perdido neste primeiro semestre representa um terço do tamanho do estado de Sergipe. 

Alex Machado/Campo Grande News

Jacaré morto servindo de alimento para urubus em área queimada no Pantanal

Especialista em litígio estratégico do Observatório do Clima, Nauê Bernardo critica o afrouxamento da legislação ambiental e a não aprovação do projeto de lei do manejo do fogo pelos deputados e senadores, que ampliaria o arcabouço jurídico sobre o Pantanal.

Ele lembra ainda que a verba do Ibama (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis) foi cortada, enquanto elogia a Lei do Pantanal de Mato Grosso do Sul, mas defende que a fiscalização e a punição sejam mais efetivas.

“A gente precisa chamar o Congresso Nacional para sentar nessa mesa, apontar a responsabilidade pelo pacote de medidas antiambientais, conversar sobre o orçamento, dizer ‘vocês estão falhando, atuando ativamente para piorar o problema’”, afirma.

Há diferenças entre teoria e prática, ele ressalta.

“No discurso, o avanço é inegável. Existe um poder público que demonstra preocupação, o alerta foi soado para todo mundo, há um estado de consternação maior. Mas peca na prática. Se a gente não agir, a coisa vai piorar exponencialmente. O que falta é uma ação diferente”, finaliza Nauê. 

O presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho declarou anteriormente à Folha que o Brasil não tem estrutura de prevenção e combate aos eventos extremos à altura da mudança climática. Reforçou que a temporada de queimadas começou no início do período de seca no Pantanal. O fogo é mais frequente no segundo semestre do ano. 

“Se ponderarmos essa antecipação , as respostas foram a contento. Talvez não suficientes ou rápidas como a sociedade espera, mas as instituições estão mais bem preparadas em equipamentos, planejamento e treinamento de pessoal”, afirma Alexandre Pereira, analista ambiental do Prevfogo, que pertence ao Ibama.

Sobre o uso do fogo no bioma, prática permitida com ressalvas para o manejo nas áreas, Pereira defende que “deixar de usar o fogo não é uma solução, mas adaptar e disciplinar o uso”.

Previsível

Relatórios como o do Serviço Geológico do Brasil já alertavam para a previsão da seca ser extrema no Pantanal este ano. Além de institutos de meteorologia terem antecipado os impactos de fenômenos como o El Ñino, por exemplo. Organizações como o MapBiomas, que acompanham os índices de desmatamento, também relacionam a seca como um dos efeitos.

“Mas mesmo com essas condições adversas, o incêndio só ocorre se houver alguma ignição. E sabemos que, no pantanal, as ignições são humanas. O principal gargalo é evitar ignições”, ressalta Renata Libonati, coordenadora do laboratório ambiental Lasa, da Universidade Federal do rio de Janeiro.

“Esse ponto é crucial para permitir uma melhor gestão do fogo no Brasil, ações preventivas e efetivas de curto, médio e de longo prazo para contrabalançar a pressão climática que está imposta”, diz Renata Libonati.

As mudanças climáticas são fator primordial nesse cenário. Mas pouco foi feito até agora, analisa outro especialista ouvido pelo jornal paulistano.

“As respostas às mudanças climáticas atrasaram não só no Brasil, mas no mundo todo. Foi um assunto ignorado e muito pouco foi feito. Até que chegamos em um ponto que nem se fala mais em reverter, mas sim em se adaptar às mudanças climáticas”, diz o professor Danilo Bandini Ribeiro, da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul.